Skip to content

Art. 2 — Se há temor do mal natural.

O segundo discute-se assim. — Parece que não há temor de mal natural.
 
1. — Pois, diz o Filósofo, que o temor nos desperta o conselho1. — Ora, não deliberamos sobre o que acontece naturalmente, como diz o mesmo autor2. Logo, não há temor do mal natural.
 
2. Demais — Os males naturais como a morte e outros, estão sempre iminentes ao homem. Se pois houvesse temor de tais males, viveríamos sempre a temer.
 
3. Demais — A natureza não move para o que lhe é contrário. Ora, o mal da natureza dela mesma provém. Logo, não é natural fugirmos desse mal. E, portanto, não há temor natural de um mal natural, ou da natureza.
 
Mas, em contrário, diz o Filósofo, que não há nada mais temível que a morte3, que é um mal natural.
 
Solução. — Como diz o Filósofo, o temor provém da fantasia de um mal futuro que causa corrupção ou tristeza4. Ora, como causa tristeza o mal contrário à vontade, assim causa corrupção o que o é à natureza; e tal é o mal natural. Logo, pode haver temor dele.
 
Devemos porém considerar que o mal da natureza tem às vezes uma causa natural, e então assim se chama, não só porque priva de um bem da natureza, mas, também porque é efeito desta; tal é a morte natural e outros males. Às vezes, porém, o mal da natureza provém de uma causa não natural; tal é a morte causada violentamente por um perseguidor. E em um e outro caso o mal da natureza é ora temido e ora, não. Pois, o temor provindo da fantasia de um mal futuro, no dizer do Filósofo, o que exclui essa fantasia também exclui o temor. Mas de dois modos pode o mal parecer futuro. — Primeiro, por ser remoto e distante. Assim, à distância nos leva a considerá-lo como não havendo de suceder, e por isso não tememos ou o tememos pouco. Pois, segundo o Filósofo, as coisas que estão muito afastadas não são temidas; assim, embora todos saibamos que havemos de morrer, com isso não nos importamos por não ser próximo5. — De outro modo consideramos como não havendo de acontecer um mal futuro, por casa da necessidade, que nos leva a tê-lo por presente. E por isso, o Filósofo diz, que aqueles que vão ser decapitados não temem6, vendo a premência da morte iminente; mas para temermos é preciso haver alguma esperança de salvação.
 
Portanto, se não tememos o mal natural é que não o consideramos como havendo de acontecer. Quando porém ele causa a morte, e é apreendido como próximo, embora nos deixe alguma esperança de salvação, é temido.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — O mal natural não provém às vezes da natureza, como já dissemos. Quando porém dela procede, embora não possa ser evitado de todo, pode contudo ser diferido. E nesta esperança podemos deliberar sobre o modo de o evitar.
 
Resposta à segunda. — O mal natural, embora esteja sempre iminente, nem sempre contudo o está proximamente. E por isso nem sempre é temido.
 
Resposta à terceira. — A morte e os outros males naturais provêm da natureza universal; mas o quanto lhe é possível à natureza particular procura evitá-los. Por onde, pela inclinação da natureza particular, sentimos dor e tristeza causadas por esses males, quando presentes; e temor, se estiverem na iminência de acontecer.

  1. 1. II Rhetoric. (cap. V).
  2. 2. III Ethic. (lect. VII).
  3. 3. III Ethic. (lect. XIV).
  4. 4. II Rhetoric. (cap. V).
  5. 5. II Rhetoric. (cap. V).
  6. 6. II Rhetoric. (cap. V).
AdaptiveThemes