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Art. 8 – Se há atos especificamente indiferentes.

(II Sent., dist. XL, a . 5: De Malo, 1. 2, a . 5).
 
O oitavo discute-se assim. ― Parece que não há atos especificamente indiferentes.
 
1. ― Pois, o mal é a privação do bem, segundo Agostinho1. Ora, privação e posse opõem-se imediatamente, conforme o Filósofo2. Logo, nenhum ato é especificamente indiferente, quase médio entre o bem e o mal.
 
2. Demais. ― Os atos humanos se especificam pelo fim ou pelo objeto, com já se disse3. Ora, um e outro é bom ou mau. Logo, todo ato humano é especificamente bom ou mau e nenhum é indiferente.
 
3. Demais. ― Como já se disse4, é considerado bom o ato que tem a devida perfeição de bondade; mau, aquele ao qual ela falece. Ora, necessariamente todo ato ou tem a plenitude total da sua bondade ou algo dela lhe falta. Logo, e necessariamente, todo ato é especificamente bom ou mau e nenhum, indiferente.
 
Mas, em contrário, diz Agostinho: há certos fatos intermediários que podem ser produzidos com bom ou mau ânimo, dos quais seria temerário julgar5. Logo, há atos especificamente indiferentes.
 
Solução. ― Como já se disse6, todo ato se especifica pelo seu objeto; e o ato humano chamado moral se especifica pelo seu objeto, referido ao princípio dos atos humanos, que é a razão. Por onde, se o objeto do ato inclui algo de conveniente à ordem da razão, esse ato será especificamente bom, p. ex., dar esmola a um pobre. Se porém incluir algo de repugnante à ordem da razão, será especificamente mau, p. ex., furtar, i. é, apoderar-se do alheio. Ora, pode acontecer que o objeto do ato nada inclua de pertencente à sobredita ordem, p. ex., ajuntar uma palha do chão, ir ao campo e outros. E tais atos são especificamente indiferentes.
 
Donde a resposta à primeira objeção. ― Há duas espécies de privação: Uma é a do ser, a qual nada deixa e tudo elimina; assim, a cegueira elimina totalmente a vista; as trevas, a luz; a morte, a vida; e entre esta privação e o modo de ser que lhe é oposto não há intermediário possível. A outra consiste em ser privado de certo modo; assim a doença é privação da saúde, não por eliminá-la totalmente, mas por predispor para a sua perda total, que se dá pela morte; e esta privação, deixando alguma coisa, não está sempre em oposição imediata como o seu contrário. Ora, deste modo é que o mal é privação do bem, como diz Simplício 7; pois, deixando algo dele, não o exclui totalmente. Por onde, pode haver um meio termo entre o bem e o mal.
 
Resposta à segunda. ― Todo objeto ou fim tem alguma bondade ou malícia, pelo menos natural mas, nem sempre implica a bondade ou malícia moral, considerada em relação à razão, como já se disse. Ora, é desta última que agora se trata.
 
Resposta à terceira. ― Nem tudo o que convém a um ato lhe pertence à espécie. Por onde, embora em a noção da sua espécie não esteja compreendido tudo o que pertence à plenitude da bondade do ato, nem por isso este há de ser especificamente mau ou bom; assim, o homem não é especificamente nem virtuoso nem vicioso.

  1. 1. Enchir., cap. XI.
  2. 2. Praedicam., cap. VIII.
  3. 3. Q. 18, a. 6.
  4. 4. Q. 18, a. 1.
  5. 5. Lib. II De serm. Domini in monte, cap. XVIII.
  6. 6. Q. 18, a. 2, 5.
  7. 7. Comment. Super lib. Praedicamentorum (in cap. De oppos.).
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